25.7.06

Nenhum problema tem solução.

Nenhum de nós desata o nó górdio; todos nós ou desistimos ou o cortamos. Resolvemos bruscamente, com o sentimento os problemas da inteligência, e fazemo-lo por cansaço de pensar, ou por timidez de tirar conclusões, ou pela necessidade absurda de encontrar um apoio, ou pelo impulso gregário de regressar aos outros e à vida. Como nunca podemos conhecer todos os elementos de uma questão, nunca a podemos resolver. Para atingir a verdade faltam-nos dados que bastem, e processos intelectuais que esgotem a interpretação desses dados.

Bernado Soares, Livro do Desassossego (trecho 333).

E o meu trabalho de todos os dias é encontrar soluções. Atraída pelos problemas que todos os dias encontro.

18.7.06

Tantas vezes

Olho para o mundo e para os dias como que para um jogo cujas regras desconheço, aleatórias, em cada instante. Os dias em nada é como deveria ser, segundo a ordem imaginária com que se deveria construir um mundo que não existe. E não poderia existir, mas que insisto em querer. Ou os dias em que nada corre bem, como tantas vezes se ouve, em que não se percebe o para quê de ter saído de manhã de casa. E continuar para além da exaustão, percebendo já a inutilidade. Continuar. Com as pequenas pedrinhas que entram para dentro dos lindos sapatos abertos de verão, que magoam os pés, que fazem ter vontade de desistir de tudo. Para quê? Que resta se desistir? Continuar.

16.7.06

Cartas

Há muito, muito tempo atrás escreviam-se cartas para os amigos. Nas folhas dos cadernos das aulas mais aborrecidas ou com a porta do quarto fechada, em folhas com desenhos de fundo ou em papel higiénico. Qualquer lugar e hora serviam. Cartas muitas vezes com letra quase ilegível, com erros ortográficos por quase nunca serem relidas. Tenho uma certa pena de não ter comigo as cartas que enviei. No tempo das cartas, o que escrevia eram pedaços de vida que oferecia, porque sei agora, esqueci quase tudo, restam apenas alguns vestígios de tanta coisa. E quem os tem, quem tem esses pedaços que juntos formam a minha vida, que vou construindo e esquecendo a cada instante. Quem tem esses pedaços são os meus amigos, outros estão nas mãos de pessoas que já esqueci ou que já me esqueceram, muitas certamente no lixo.

11.7.06

Esquecia-me... FÉRIAS

Daqui a 31 dias: Marrocos, Atlas. 8 dias de montanha na expectativa que o Jbel Toubkal esteja lá, não se esconda e esteja disposto a deixar-me chegar ao topo. E lá mais para Outubro: Sicilia. Com o Etna e o Stromboli em mente. Dois "vulcõezinhos" sedutores que me encorajam a passear por entre Italianos.

1.7.06

porque viver cansa

pela imperfeição do mundo, dos dias, das gentes. do eu. imperfeição que tem que existir pelo simples facto de olhar tudo à minha volta pelo meu olhar sempre limitado, sempre imperfeito. sei que é assim, que terá que ser assim e nem por isso deixa de incomodar, de doer. o conformismo é, tantas vezes, tão doloroso como o inconformismo. e há um volume tão pequeno à minha volta em que eu posso mexer e sempre correndo o risco de aumentar a sua imperfeição, sendo eu tão imperfeita como tudo isto. cansada dos dias em que tanta "coisinha" corre estúpidamente mal. incomodada com todas estas coisas, com a imperfeição, mesmo sabendo há uma vida que é sempre tudo assim. que é assim que o mundo gira. mas cansada, parece que todas as arestas dos dias se espetam mais profundamente, me magoam mais do que deveriam.

26.6.06

Na matemática existencial (...): o grau de lentidão é directamente proporcional à intensidade da memória; o grau de velocidade é directamente proporcional à intensidade do esquecimento. Milan Kundera, A lentidão

Uma frase que me surgiu nestes dias muito forte, juntamente com quem, em tempos, me falou nela. Talvez recordada pela velocidade dos dias que correm. E a quantidade de coisas esquecidas. Esquecidas na memória, esquecidas na vida, em cada dia. Enquanto, cansada, depois de chegar a casa e enquanto o jantar se cozinhava, trasfeguei o hidromel. Lembrei-me que para ter aqueles garrafões, tinha perdido uma manhã, na feira do Relógio em busca de um senhor que "estou logo ali à entrada, vê-me logo". E explicar para que era "tanto" mel à vendedora. Passaram alguns meses, parece que nada passou, mas tudo está tão distante. Excesso de velocidade. Desejo de esquecimento.

24.6.06

331.

Doem-me a cabeça e o unviverso. As dores fisícas, mais nitidamente dores que as morais, desenvolvem, por um reflexo no espírito, tragédias incontidas nelas. Trazem uma impaciência de tudo que, como é de tudo, não exclui nenhuma das estrelas. Bernardo Soares, Livro do Desassossego

5.6.06

e depois de tudo limpo é o pacote de arroz que cai ao chão.

4.6.06

vida doméstica

quando as forças ou o tempo se esgota. ou as duas em simultâneo. e a casa está acabada de limpar, como eu gosto de a ver mas nunca tenho tempo ou paciência. o copo de vidro mais grosso cai da última prateleira do armário e desfaz-se num número infinito de pedacinhos que se espalham por cada milímetro de chão de cozinha, por de trás das garrafas, entre os pés das pernas das mesas e das cadeiras, por baixo do frigorifico, do fogão, estendem-se à varanda, ao quarto à sala. por toda a casa os pedacinhos ínfimos, quase invisíveis de vidro castanho da cor do chão. e fico ali parada, descalça, frágil, com vontade de fugir para sempre, sem saber como me mexer. descalça, rodeada de um mar de vidros.

1.6.06

Dia da criança

Tenho a sensação de que estou a escrever um artigo em banda desenhada...