28.6.07

Para poder encontrar-me a mim mesmo, tive primeiro de me perder. Tive de chegar ao pleno vazio de mim. Não foi um vazio imóvel, um compasso de espera na dança do ser: o meu vazio foi um rodopiar imparável de dinâmica negativa, de tal forma que desistir surgiu, por fim, como premente solução lógica para acabar de vez com o tormento daquele excesso giratório. Tinha dezanove anos. A minha vida, para todos os efeitos, mal começara. Mas antes mesmo de ter podido pisar-lhe o palco, parecia ter chegado já o momento de fechar o pano. A tragédia grega ensina que "o amor não deve atingir a própria medula da alma". Mas na vida de alguns de nós, de preferência uma única e irrepetível vez, a medula da alma é atingida pelo amor. Felizes os que sobrevivem.

Frederico Lourenço in A formosa pintura do mundo

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